Nosso sócio-gestor Luis Fernando Guerrero, da área de Contencioso Judicial, Arbitragem e Soluções de Conflitos, falou sobre Lei de Recuperação e Falência em artigo publicado no portal JOTA. Leia o conteúdo completo:
Alto índice de falências faz necessária revisão de lei
Comissão de juristas trabalha junto ao Governo para alterar Lei de Recuperação
No Brasil, o alto índice de falência das empresas em recuperação judicial prejudica fortemente a geração de empregos e a estabilidade econômica. Essa não é nenhuma novidade. Apenas 2% das empresas que entram em recuperação judicial efetivamente caminham para um retorno irrestrito ao mercado.
É nesse horizonte que uma comissão de juristas está trabalhando junto ao Governo Federal para relevantes alterações na Lei de Recuperação e Falência, e apontam para uma direção nas opções políticas a serem feitas no trajeto.
O risco inerente às atividades empresariais demanda formas satisfatórias de reorganização e recuperação econômica em situações que a atividade é comprometida por problemas financeiros e administrativos graves.
São conhecidas em nosso sistema jurídico estruturas de concordata e falência previstas no Código Comercial de 1850 e, especialmente, no Decreto-lei 7.661 de 1945.
Por mais de 150 anos o regime de reorganização do pagamento de dívidas ou liquidação de empresas foi lastreado em aspectos processuais que mais estavam relacionados com ordem e forma de pagamento de credores do que com a melhora da gestão das empresas e a facilitação e diminuição do custo do crédito.
Assim, foi promulgada a Lei 11.101/2005, que buscou modificar o papel dos credores no contexto da reorganização das empresas e reestruturá-las, especialmente, para que o crédito disponível a elas pudesse ser mais acessível. A lei representou um grande respiro para que as empresas que optassem pela recuperação pudessem pagar as suas dívidas de modo projetado e prosseguir as suas atividades com a garantia de continuidade de contratos essenciais e a possibilidade de venda de ativos a terceiros que, via de regra, não seriam responsáveis pelos débitos da empresa recuperanda, por exemplo.
Passada mais de uma década da vigência na lei, contudo, a realidade superou o que fora projetado e a necessidade de uma revisão e alterações de definições tornou-se imperativa.
O que os estudiosos verificaram foi que a recuperação nos moldes da Lei 11.101/2005 se mostrou um processo bastante caro e complexo, inclusive para muitos credores, que se viam impedidos de acompanhá-lo e muitas vezes compreendê-lo. Os rumos da empresa em recuperação acabavam restritos a poucos credores, com destaque para aqueles inscritos em categorias em que o valor do crédito é representativo para o voto.
Para o empresário, a recuperação é apenas a última saída antes da falência por conta da perda de sua autonomia na definição dos rumos da empresa, que passa a ser dos credores, ou melhor, no final das contas e quando conveniente, de alguns deles.
Ademais, os Planos de Recuperação, instrumentos poderosos para o convencimento de credores e efetiva recuperação da empresa, não são parcimoniosos e partem de projeções irreais que, caso a empresa tivesse atingido algo próximo dos resultados indicados, jamais estaria em recuperação. Nem se contem os deságios elevados e o parcelamento em longuíssimas parcelas aos quais os credores estão sujeitos via de regra.
Deste modo, há a necessidade de uma racionalização do diálogo entre credores e empresa recuperanda, que não pode ser restrito às oportunidades de uma assembleia realizada no local em que a empresa tem suas atividades principais e apresentou o seu pedido de recuperação.
Além disto, há, em nosso país, um relacionamento dinâmico entre fornecedores e compradores, que demanda um administrador judicial preparado para o cargo e, de fato, responsável por fiscalizar o dia a dia da empresa, criando um regime de confiança de todos os envolvidos no processo.
Surge, então, a ideia interessante de uma perícia prévia para analisar as condições da empresa e a viabilidade e adequação do processo de recuperação requerido, economizando, inclusive, recursos públicos que seriam gastos com um processo que não levaria a outro resultado senão a falência.
Outra questão relevante é o valor dos empréstimos para as empresas em recuperação, que precisam e muito de crédito, mas também oferecem, e muito, risco para quem se dispuser a emprestar dinheiro. Neste aspecto, não é só o caso de alteração legislativa no tocante à recuperação judicial, mas também em regras do Banco Central de modo a diminuir a necessidade de provisões dos bancos que fizerem empréstimos desta natureza e, mais ainda, sem criar um risco sistêmico. O equilíbrio é tênue e a solução está muito longe de ser simples.
Por fim, o Fisco poderá ser incluído de algum modo na recuperação. Trata-se de um credor muitas vezes relevante das empresas e que, por não estar incluído no processo de recuperação, torna esta alternativa inócua para as empresas.
A Lei de Recuperação e Falência já sofreu intervenções pontuais, inclusive por meio de Medidas Provisórias, para inclusão, por exemplo, deste regime caro e longo para micro e pequenas empresas, e parece mesmo ser o caso de uma adequação estrutural a impedir que o regramento de questões jurídicas tão relevantes se tornem colchas de retalhos com pouco ou sem nenhum efeito prático.
De qualquer modo, o caminho é longo e a atenção de todos aqueles que militam na área empresarial é relevante para que as necessidades observadas na consultoria às empresas sejam reconhecidas em lei.
Luis Fernando Guerrero – Sócio-gestor da área de Contencioso Judicial, Arbitragem e Soluções de Conflitos do Lobo & de Rizzo Advogados